A estrada parecia mais longa do que Luna lembrava.
Mas talvez fosse ela que estivesse diferente.
Sentada na janela do ônibus, sentia o vento bater no rosto como um lembrete:
ela podia estar ali, agora, porque quis.
Não fugia.
Não era levada.
Era ela mesma quem se conduzia.
A cidade apareceu como uma pintura antiga:
fachadas gastas, postes que tilintavam ao vento, aquele cheiro específico de pão velho e lembranças.
E, no fim da rua onde cresceu, a casa da mãe.
— Filha?
O abraço foi longo.
Não teve pressa.
Não teve perguntas imediatas.
Apenas o entrelaçar de duas mulheres que se pareciam mais do que admitiam.
Luna sentiu a respiração da mãe no pescoço.
O cheiro familiar do sabão em pedra.
O cansaço silencioso que ela nunca deixou transparecer.
— Você tá diferente — disse a mãe, quase um protesto.
— Mas tô viva. E melhor do que nunca.
— Tá amando?
Luna não respondeu.
Apenas sorriu e encostou a cabeça no ombro dela.
Os dias seguintes foram uma colcha de memórias.
Reencontrou o quarto antigo.
O espelho rachado.
A boneca sem braço que nunca quis jogar fora.
Abriu o guarda-roupa e encontrou um casaco que usava na adolescência.
Passeou pelas ruas da infância.
Viu vizinhos.
Ouviu risadas de crianças que brincavam como ela brincava.
Mas o passado não doía mais.
Agora, era apenas pano de fundo.
Ela era outra.
Tinha sua história própria.
Enquanto isso, Heitor esperava.
Tentava manter a rotina:
Regava o jardim.
Pedia iFood.
Dormia mal.
O sofá parecia grande demais sem ela.
O ateliê, silencioso demais.
Alexa perguntava todas as manhãs:
— Deseja redefinir o perfil de Luna?
E todas as manhãs, ele dizia:
— Não.
Heitor se pegava abrindo a porta do quarto dela só para sentir o cheiro deixado no travesseiro.
Às vezes, dormia ali.
Deitado de lado.
Como se ela ainda estivesse ali, de costas, respirando devagar.
Sentia falta até do jeito que ela deixava as coisas.
Dos seus quadros.
Do controle da casa largado no balcão da cozinha.
Agora tudo estava diferente.
Demais.
E ele percebia:
não era mais a casa que guardava Luna.
Era Luna que dava sentido à casa.
Na cidade natal, Luna andava mais leve.
Conversava com a mãe na varanda até tarde.
Fazia bolos, Fazia Cuscuz.
Dormia até tarde.
E às vezes… pensava em Heitor.
Não com saudade romântica, mas com aquela fome antiga de quem reconhece onde mora o próprio desejo.
Escreveu no caderno novo:
“É estranho voltar e perceber que não pertenço mais aqui.
Mas também é bonito saber que existe um lugar — e alguém — onde eu pertenço por vontade.
E que posso ir, e voltar, e ser recebida sem algemas.
Isso… é liberdade.
Isso… é amor.”
Na última noite antes da volta, ela ligou para Heitor.
— Oi.
— Você tá bem?
— Tô.
— Eu sinto sua falta.
Silêncio.
Ela sorriu do outro lado da linha.
— Tô voltando amanhã.
— Eu vou buscar?
— Não precisa.
— Mas eu quero.
— Então… tá bom.
— Tá trazendo alguma coisa?
— Tô.
— O quê?
Ela respondeu devagar, com a voz baixa:
— Saudade no corpo e beijo na boca.
Heitor ficou mudo.
Luna riu, satisfeita.
— Até amanhã, Heitor.
— Até, Luna.
Naquela noite, ele trocou os lençóis da cama.
Fez compras.
Preparou a playlist favorita dela.
Organizou a estufa.
Deixou a vela perfumada do lado do sofá.
E pela primeira vez, desde que ela partiu, dormiu com um sorriso leve no rosto.
Sabia:
o corpo dela vinha com promessas não ditas.
E quando atravessasse novamente a porta daquela casa,
não viria apenas como mulher que retorna…
Mas como mulher que escolhe ficar e incendiar tudo.
Próximo capítulo:
Capítulo 14 – O Retorno, Luna volta para casa e os dois têm seu primeiro reencontro mais quente, com desejo acumulado, toques mais ousados e um aprofundamento físico e emocional do vínculo.