Ela Viajou para Dentro Dele: Capítulo 32 – Nova York

Nova York tinha um cheiro diferente.
Era um cheiro de velocidade, de metal, de café forte.
Era um som de sirenes misturado com passos apressados e buzinas impacientes.
Era uma cidade que não esperava ninguém.
E isso fascinava Luna.

Eles desceram no aeroporto JFK depois de longas horas de voo. Luna não parecia cansada — seus olhos brilhavam como se ela tivesse acabado de acordar de um sonho bom.
Heitor, ao contrário, estava tenso. O olhar atento, como se cada pessoa ali fosse uma ameaça invisível. Como se estivesse prestes a lutar por ela a qualquer segundo.

— Você vai amar isso aqui — ela disse, sorrindo ao puxar a mala.

— Eu só quero que você esteja segura.

Ela deu de ombros, já entusiasmada com tudo ao redor.

Foram recebidos por uma equipe simpática da galeria. Um carro exclusivo os aguardava e, durante o trajeto até o hotel, Luna mal conseguia disfarçar o encantamento com os arranha-céus, com a arquitetura viva, com os letreiros que pareciam gritar possibilidades.

— Você já esteve aqui? — ela perguntou.

— Sim. Eu amo voar. Eu amo aviões. Eu amo Nova York — ele respondeu.

Ela riu.

— Aqui ninguém pertence a ninguém, Heitor. Isso te assuste.

— Eu só não quero te perder no meio disso tudo.

— Você não vai me perder.
A não ser que tente me prender de novo.

Ele não respondeu.

O hotel era impecável. O tipo de lugar onde os funcionários sorriem com os olhos e as toalhas têm o cheiro perfeito. O quarto era amplo, moderno, com uma vista que parecia ter sido desenhada à mão.

Luna se jogou na cama e ficou ali, apenas respirando o ar de um mundo novo.
Heitor a observava em silêncio, carregando um nó no peito.

Os dias que se seguiram foram intensos.
Luna começou a frequentar reuniões com outros artistas, galeristas, empresários e críticos. Todos queriam ouvir o que ela tinha a dizer.
Todos queriam vê-la crescer.

Heitor a acompanhava sempre, mas já não conseguia acompanhar tudo.
As conversas se tornavam técnicas demais, as conexões se multiplicavam, e Luna florescia sem precisar da sombra dele.

E isso o corroía.

Durante um brunch com um dos curadores da galeria, Heitor percebeu o olhar demorado de um dos organizadores sobre Luna. Um tipo de admiração que ultrapassava o simples profissionalismo.

Heitor apertou o copo com mais força do que deveria.

Luna percebeu.

— Você não precisa disso — ela disse baixinho, depois que o evento terminou.

— Disso o quê?

— Disso. De tentar marcar território o tempo todo.

— Eu só… estou cuidando.

— Você está com ciúmes. De novo.

— Eu não confio neles.

— Então confia em mim.

Ele desviou o olhar.

As redes sociais de Luna começaram a crescer rápido.
Fotos de bastidores, vídeos curtos, trechos das reuniões. Ela ganhava visibilidade, fãs, admiradores. Convites para eventos privados.
E Heitor, mesmo ali, mesmo presente, começou a sentir o peso de não estar mais no centro de tudo.

Uma noite, enquanto ela organizava materiais no quarto, Heitor sentou-se no sofá, tenso.

— O que foi? — Luna perguntou, sem parar de escrever.

— Eu só quero entender…
Se eu não tivesse financiado tudo isso, você ainda estaria me levando com você?

Ela parou. O silêncio foi mais cruel do que qualquer resposta.

— Eu te levaria porque você faz parte da minha vida. Não porque você me pagou um ingresso.

— Mas e agora? Você ainda me quer lá?

— Eu quero. Mas não como meu supervisor. Como meu parceiro. Como meu amigo. Como meu amor.
Mas se for pra ficar me vigiando, Heitor… você vai se perder de você mesmo.
E talvez de mim também.

Ele passou a mão pelo rosto, cansado, dividido entre o alívio e a angústia.

— Eu não sei ser esse cara. Eu quero ser. Mas eu não sei.

— Aprende.
Eu estou aprendendo a andar sozinha. Você pode aprender a andar ao meu lado.

Ele se levantou, aproximou-se e tocou o rosto dela.

— Eu não quero que ninguém te roube de mim.

— Ninguém pode me roubar, Heitor.
Só eu posso decidir se quero ficar ou ir.

— Você ainda quer ficar?

— Eu ainda quero. Mas não me prende de novo. Não transforma essa viagem em mais um labirinto.

Ele a abraçou com força, como quem tenta gravar a textura da pele, o cheiro do cabelo, o ritmo do coração.

— Eu tô tentando confiar.
Mas não me pede pra não sentir ciúmes. Isso eu não vou prometer.

— Eu não te peço pra não sentir.
Eu te peço pra não agir como se fosse dono.

— Eu te amo, Luna.

— Eu sei.
E eu amo você também.
Mas aqui…
Aqui eu sou minha.

Heitor a segurou mais forte por alguns segundos e depois soltou.

— Vamos continuar.
Eu vou andar com você.
Mesmo que doa.

Ela sorriu.

— Mesmo que doa.

E seguiram, lado a lado, por uma Nova York que parecia abrir portas a cada esquina.

Mas o ciúmes de Heitor, mesmo contido, era uma chama que ainda ardia.

E Luna, por mais livre que estivesse, ainda carregava o peso de quem sabe:
Às vezes, o amor também tem garras.

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