O Dia em que a Éclair Virou Bomba (e a Nutella Virou Amendoim)

Fim de tarde, céu alaranjado, clima de pós-treino no ar. Um menino, com a regata da Nike ainda suada, bermuda dry-fit e tênis branco brilhando, saiu da academia com uma missão clara: comer um doce. Era só isso. Um mimo depois de pegar pesado no treino.

Caminhando pela calçada, viu uma padaria simples, daquelas de bairro, com vitrine meio embaçada e cheiro de pão fresco misturado com café coado. Era a Padaria do Aeroporto, onde todo mundo se conhece e o fiado é na confiança.

Entrou, tirou o fone do pescoço e deu uma olhada nas opções. Parou ali na frente da vitrine, encantado com um doce que reluzia sob a luz fria.

Chamou a atendente:

— Boa tarde, moça. Vocês têm éclair?

A funcionária, que já tinha atendido uma fila de pedreiros e aposentadas naquele dia, franziu a testa:

— É o quê, moço?

— Éclair… 

Ela olhou pra colega do caixa e cochichou:

— Esse menino tá inventando nome agora?

A outra respondeu baixinho:

— Deve ser nome chique do trem mesmo. Manda ele apontar.

— Moço, aponta aí com o dedo qual que é esse doce que cê quer.

Ele apontou, com um sorriso no rosto:

— Esse aqui, ó. Éclair aquele doce compridinho, francês, com cobertura de chocolate…

As duas olharam e falaram juntas, como se já soubessem a resposta há décadas:

— Ah! Isso aí é bomba, uai!

Ele riu, ajeitando a regata no ombro:

— Então… o nome certo é éclair.

A atendente deu risada:

— Aqui não tem esse negócio de nome francês, não. Aqui é bomba. Vai querer uma?

— Depende… qual é o recheio?

— Nutella!

O moço arqueou a sobrancelha, com olhar de desconfiança:

— Mas é Nutella mesmo?

As duas funcionárias se entreolharam, rindo de canto de boca.

— Então… é Nutella, mas não é Nutella.

— Como assim? É ou não é?

A mais velha, a mais experiente do balcão, entrou na conversa limpando a mão no pano de prato:

— É tipo Nutella, mas não daquelas de marca, sabe?

Ele respirou fundo, tentando manter a paciência pós-treino.

— Mas é de avelã?

Elas ficaram pensativas.

— Melhor mostrar o pote, né?

Sumiram nos fundos e voltaram com o pote do famoso “recheio de Nutella que não é Nutella”.

O menino leu o rótulo, fez cara de decepção e soltou:

— Moça… isso aqui é creme de amendoim!

As duas arregalaram os olhos como se tivessem descoberto um segredo de Estado.

— Ué… não é creme de avelã, não?

— Não. Nem perto. É só creme de amendoim mesmo.

As funcionárias riram, meio sem graça.

— É que aqui o povo chama tudo de Nutella. Não repara, não.

O moço com um sorrisinho sarcástico, cansado de tentar corrigir o mundo.

— Então não vou querer.

Treinar é difícil, mas entender o cardápio é mais ainda.”

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